"o resto é mar. é tudo o que eu não sei contar..."

26 maio 2010

Responda depressa:

Como se faz uma feira do livro sem professores, nem estudantes, nem leitores???

Com comerciantes de livros: SALIPI (Salão do livro Piauiense).

Os professores da rede municipal de ensino de Teresina não terão nem um incentivozinho para fazer uma visita ou assistir palestras. E seus alunos, se quiserem, acharão um jeito de sair da periferia e ir ao centro da cidade.

E como diria um certo professor de estilística: "É a Fazenda Piauí!"

17 maio 2010

era um homem comum. sem grandes dúvidas, incertezas ou indecisões. não se debruçava sobre as catástrofes naturais, a miséria, o imperialismo ianque, os caminhos da filosofia ocidental, análises sociológicas sobre o nada. era um homem. e isso já era sofrer demais. isso já era tudo. não lhe doía a ignorância, os silêncios e reticências que encontrava nas coisas do mundo. não lhe desconcertavam as intempéries do cotidiano, os mal entendidos, os chove-não-molha da vida. nada disso fazia sua testa porejar uma gota de suor sequer, não produzia uma noitezinha de insônia.

mas amava. ao seu modo, reticente. silenciosa e calmamente, via seus dias consumidos pela torturante ideia de possuir um botão, ao menos, do objeto do seu amor. ele sabia que sua vida não seria outra. ele não ia mudar sua rudeza em puro e tenro mel. ele amava. apenas. sem grandes promessas, sem grandes feitos, sem grandes provas.

por isso, um dia, catou da mesa dela um pedacinho de unha quebrada, pintada de branco. a queratina tinha o cheiro dela. guardou-a no bolso da camisa e voltou a trabalhar novamente, às voltas com as questões banais do seu cotidiano igualmente banal, e nunca deixou que ela soubesse daquele pedaço de unha, que agora era seu.

08 maio 2010

uma (boa) dose de reflexão linguística

A CATÁSTROFE DOS CURSOS DE LETRAS
Marcos Bagno - Novembro de 2008


A formação dos professores de português, hoje, no Brasil, é uma catástrofe. Nós, os responsáveis pelos cursos de Letras, não enxergamos a bomba-relógio que temos nas mãos. As estatísticas não mentem: a retumbante maioria dos estudantes de Letras vêm de camadas sociais pobres ou mesmo miseráveis, filhos de pais analfabetos ou que têm escolarização inferior a quatro anos. Isso significa muita coisa. Significa que esses estudantes têm um histórico de letramento muito reduzido: no ambiente familiar, não convivem com a cultura letrada, não têm acesso a livros, revistas, enciclopédias etc. Significa que não são falantes das normas urbanas de prestígio (as mesmas que supostamente terão de ensinar a seus futuros alunos) e têm domínio escasso da leitura e da escrita. Só na faculdade é que a maioria deles vai ler, pela primeira vez na vida, um romance inteiro ou um texto teórico. Vêm, quase todos, do ensino público, essa tragédia ecológica brasileira muito pior que as queimadas na Amazônia. Nós, porém, fingimos que eles são ótimos leitores e redatores, e despejamos sobre eles, logo no primeiro semestre, teorias sofisticadas, que exigem alto poder de abstração e familiaridade com a reflexão filosófica, e textos de literatura clássica, escritos numa língua que para eles é quase estrangeira. E assim vamos nos iludindo e iludindo os estudantes.

O resultado é que os estudantes de Letras saem diplomados sem saber lingüística, sem saber teoria e crítica literária e sem saber escrever um texto acadêmico com pé e cabeça. Todos os dias, recebo mensagens de formandos que me pedem orientação para seus trabalhos finais. Alguns até me enviam seus projetos. São textos repletos de erros primários de ortografia, pontuação, sintaxe, vocabulário, com frases truncadas e sem sentido. Assim eles chegam ao final do curso, e suas monografias, mal escritas, sem nenhum rigor teórico ou metodológico, são aprovadas alegre e irresponsavelmente por seus supostos orientadores.

O problema, é claro, não está no fato (que merece comemoração) de acolhermos na universidade alunos vindos das camadas mais desfavorecidas da população. O problema é não oferecermos a eles condições de, primeiro, se familiarizar com o mundo acadêmico, que lhes é totalmente estranho, por meio de cursos intensivos (e exclusivos) de leitura e produção de textos, de muita leitura e muita produção de textos, para só depois desses (no mínimo) dois anos de preparação eles poderem começar a adentrar o terreno das teorias, das reflexões filosóficas, da alta literatura. Se não fizermos isso urgentemente (anteontem!), as salas de aula do ensino básico estarão ocupadas por professores que, mal sabendo ler e escrever adequadamente, não poderão desempenhar sua principal tarefa: ensinar a ler e a escrever adequadamente! Não sei, aliás, por que escrevi "estarão ocupadas": elas já estão ocupadas, neste momento, por essas pessoas, de quem se cobra tanto e a quem não se oferece uma formação docente que também seja, minimamente, decente.

retirado de: http://www.marcosbagno.com.br/conteudo/arquivos/art_carosamigos-novembro.htm

05 maio 2010

e era porque eu nem sabia vender sonhos. as coisas se desmanchavam na minha mente sem conseguir chegar ao mundo e minhas mãos só mostravam abortos, metades, deformidades: monstros.
fiz uma prece, mas nenhum santo me ouviu. fiz apostas, mas todos os dados viciados apontavam para o mesmo fim e eu, nessa beira de rio, de vida, me satisfazia com a margem. a água do rio lambendo as pontas dos meus dedos... era o mais bonito que eu conseguia viver. e nem era eu inteira.