"o resto é mar. é tudo o que eu não sei contar..."

09 fevereiro 2011

sobre lembranças



uma lembrança pousa na lapela ou na aba do chapéu. ela pesa. então você passa a mão rudemente, como forma de se livrar do peso, do incômodo que gera a lembrança. mas ela não sai, não cai. e isso te faz pensar em parar e sacudir a lapela, tirar o chapéu. mas, no fundo, tu sabes que nada fará esse peso sair de tuas mãos, de tua cabeça e de teu coração. o que resta a ti é caminhar com os pés acorrentados, as mãos ocupadas pelo vácuo. o que resta é continuar a caminhar imaginando ser a lembrança uma rosa agarrada ao teu chapéu ou à tua lapela. e, como toda rosa, essa que aí vai indolente, surda ao teu desespero, será lançada ao chão, naturalmente, cumprindo um ciclo banal, trivial.
talvez a rosa morra no teu chapéu, talvez faça de tua lapela o túmulo onde repousará. restará a ti, no início, o pranto que visita os olhos numa noite profunda. depois, soluços abafados, lágrimas secas, será apenas um lugar vazio, sem mancha de lembrança ou rosa. sem espinhos. sem perfume. teu chapéu voltará a ser um chapéu. tua lapela voltará a ser uma lapela. e teu peito, apenas teu peito.

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