"o resto é mar. é tudo o que eu não sei contar..."

22 novembro 2009

o voo

Um pássaro pequenino adentrou o terraço sem saber direito o que havia alí. Tombou ao bater de frente com a parede que ele não sabia que estava ali. Eu não sabia como pegá-lo em minha mão sem assustá-lo ainda mais. Mas foi natural: de repente arranjei um jeito de aconchegá-lo em minhas palmas e ele controlou as asas que batiam medrosamente e se deixou apanhar. Ele sabia que ia morrer e eu sabia que ele não precisava de mim para se salvar, mas mesmo assim entreguei meu cuidado àquele ser tão miúdo, fraco e corajoso. O levei ao quintal, e abri as mãos para ele alçar seu segundo voo libertador.
O céu brilhando naqueles olhinhos falavam de uma liberdade que eu não conhecia. Falavam ainda daquela força que não pertence a todos, somente a uns poucos é dado o prazer de senti-la. Ele alçou um voo breve e pousou no muro, de frente pra mim. Ele me olhava com uns olhos de pena, me dizendo que eu não precisava de nada nem ninguém para me apanhar e retirar daqueles quatro muros que me encerravam do mundo e das pessoas. Dizia ainda que eu não tinha asas, mas tinha pernas para correr, dançar e ir ao encontro de tudo o que eu achasse belo e de tudo o que completasse minha beleza.
Os olhos do pássaro ainda cantavam outra vida, profetizavam coisas e fatos para minha vida tão dependente de certezas, tão parcamente envolta em mantos protetores, tão descuidadamente solta de mim.

E, sem mais, ele se foi.

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