"o resto é mar. é tudo o que eu não sei contar..."

30 janeiro 2010

flores do mal



hoje o dia amanheceu sem dó... nem piedade... de mim.

Não me atire no mar de solidão,
Você tem a faca, o queijo e meu coração nas mãos.
Não me retalhe em escândalos,
Nem tampouco cobre o perdão,
Deixe que eu cure a ferida dessa louca paixão
Que acabou feito um sonho
Foi o meu inferno, foi o meu descanso.
A mesma mão que acaricia, fere e sai furtiva
Faz do amor uma história triste.

O bem que você me fez nunca foi real
Da semente mais rica nasceram flores do mal.

Não me atire no mar de solidão,
Você tem a faca, o queijo e meu coração nas mãos.
Não me retalhe em escândalos
Nem tampouco cobre o perdão
Deixe que eu cure a ferida dessa louca paixão.
Não me esqueça por tão pouco
Nem diga adeus por engano
Mas é sempre assim

A mesma mão que acaricia, fere e sai furtiva
Faz do amor uma história triste.
O bem que você me fez nunca foi real
Da semente mais rica nasceram flores do mal.

24 janeiro 2010

you may say I'm a dreamer, but I'm not the only one...



não sou mesmo a única que ainda acredita nos bons sentimentos que fazem as pessoas se atraírem, e que impulsionam boas ações.
sonhadora?
pode ser...
mas tenho o poder de renascer.

o poema de Cora Coralina fala bem mais (e melhor!!) do que eu:

OFERTAS DE ANINHA (Aos Moços)

Eu sou aquela mulher
a quem o tempo
muito ensinou.
Ensinou a amar a vida.
Não desistir da luta.
Recomeçar na derrota.
Renunciar a palavras e pensamentos negativos.
Acreditar nos valores humanos.
Ser otimista.

Creio numa força imanente
que vai ligando a família humana
numa corrente luminosa
de fraternidade universal.
Creio na solidariedade humana.
Creio na superação dos erros
e angústias do presente.

Acredito nos moços.
Exalto sua confiança,
generosidade e idealismo.
Creio nos milagres da ciência
e na descoberta de uma profilaxia
futura dos erros e violências do presente.
Aprendi que mais vale lutar
Do que recolher dinheiro fácil.
Antes acreditar do que duvidar.

(Vintém de Cobre – Meias Confissões de Aninha, p. 156, 8°ed.1996)

23 janeiro 2010

Avatar



confesso que precisei assistir o filme pela segunda vez para gostar. é claro que a sala 3d ajudou um bocado, mas mesmo sem os oclinhos mágicos, eu teria aprendido a gostar. Tudo por causa das árvores sagradas que protegem os Na'Vi.
num dos meus posts recentes, eu citei essa metáfora e agora volto a retomá-la com Avatar. mas dessa vez, não é apenas a árvore que faz a diferença na vida de seres que ainda estão distantes de uma civilização mecanizada, tecnicista e tecnologicamente bitolada. a natureza, como um todo, é responsável por manter o equilíbrio entre todos os seres que a compõe, entre eles, os tais humanóides.
mas as árvores têm aspecto central e fundamental. Onde as tribos se reúnem? Onde eles dorme? Onde o casalzinho passa a primeira noite juntos? Qual o motivo do grande conflito? Pois é... uma árvore! e esse elemento é à toa? só se o diretor e o roteirista do filme fossem tolos, ou burros mesmo. A árvore é símbolo maior por remeter ao progresso e ao crescimento não apenas físico. quem um dia já plantou uma árvore sabe que o cultivar é o mais dificil. plantar é fácil demais (é que nem fazer filho): abre-se um buraco na terra e deposita-se a semente. cultivar, ah! isso é bem mais dificil. só cultiva quem ama, quem está disposto a se livrar, pelo menos algumas vezes, da própria individualidade, do egoísmo que impede de enxergar o futuro de uma outra vida que não a própria.
cultivar é aprender a ver o outro("Eu vejo você"), planejar o bem do outro, agir (de modo certo ou errado, atrapalhadamente, eu diria) com vistas à melhoria das pessoas que te dão amor, atenção, colo... e quando todo esse bem praticado a favor de quem quer que seja (quaisquer que sejam as pessoas) retorna, é a natureza respondendo, retribuindo o amor dispensado no cultivo.
Por que é bom quando a natureza nos ouve.

20 janeiro 2010

EU QUERIA TER UMA BOMBA!!!



quem já leu alguns dos meus posts já deve ter percebido que eu não gosto de maiúsculas, exceto em nomes de gente que merece ter mesmo maiúscula ou em letras de música, filmes, cds, enfim... mas esse post, particularmente, vem com o título grafado em maiúsculas (e ainda com as três exclamações) por pedido da letra da música. na verdade, a letra EXIGE!!! (rsrsrs) que se grite a frase chave da canção.
segundo a Wikipédia(minha maior auxiliadora na construção desse blog, depois do Google rsrsrs), "Eu queria ter uma bomba é uma canção da banda Barão Vermelho, interpretada por Cazuza. Gravada em 1984 para o disco Maior Abandonado, a canção foi excluída do álbum, porém, foi incluída mais tarde na trilha sonora nacional da telenovela A Gata Comeu, exibida pela Rede Globo na faixa das 18h em 1985."
então, mais uma música de separação, de gente que não se entende e que não sabe o que quer (por que elas são as melhores???). Achei o clip no Youtube (meu outro parceiro nessa atividade blogueira) e assisti inúmeras vezes! sabe aquela alta tecnologia da década de 80? pois é... o clip é repleto de signos e significados que dialogam entre si de forma plena! apesar do excesso de cenários e personagens e histórias entrecruzadas, tudo ali faz sentido. Destaco (principalmente) duas cenas: a primeira: Cazuza, no palco de um bar chinfrim, canta a música com toda a banda (Barão) e seu microfone é, na verdade, uma granada que ele aciona jogando na luminária central do bar, ao tempo em que grita EU QUERIA TER UMA BOMBA!!! e a segunda cena mais "massa" é a última: uma ilusão é produzida: o público pensa que o personagem central faz as pazes com sua namorada, quando, na verdade, ele vê a cena na tv e, como se não bastasse essa "caída na realidade", a tv explode!!! BUUUUMMMM!!!!!!!!!!!!!! rsrsrsrs...
Cara, muito massa. Destaque também para a ironia com que é tratada a burguesia (não nos esqueçamos que foi o mesmo Cazuza que disse: "A burguesia FEDE", e ainda "A tua piscina tá cheia de ratos, tuas ideias não correspondem aos fatos"...)
Infelizmente, não sei como fazer para postar o clip aqui(eu sei, eu sei... preciso aprender!), mas deixo o link:



Aí a vai a letra:

Solidão a dois de dia
Faz calor, depois faz frio
Você diz "já foi" e eu concordo contigo
Você sai de perto, eu penso em suicídio
Mas no fundo eu nem ligo
Você sempre volta com as mesmas notícias
Eu queria ter uma bomba
Um flit paralisante qualquer
Pra poder me livrar
Do prático efeito
Das tuas frases feitas
Das tuas noites perfeitas

Solidão a dois de dia
Faz calor, depois faz frio
Você diz "já foi" e eu concordo contigo
Você sai de perto eu penso em homicídio
Mas no fundo eu nem ligo
Você sempre volta com as mesmas notícias
Eu queria ter uma bomba
Um flit paralisante qualquer
Pra poder te negar
Bem no último instante
Meu mundo que você não vê
Meu sonho que você não crê

no meu lugar



esse post vem com uma mistura assim, um tanto inusitada. seu título remete à música interpretada por Lú Horta em seu cd Paraíso Eu, do ano passado. E a imagem é do filme Wall.e.
não vou explicar muito. (dizem que o escritor que explica demais subestima seu leitor...) enfim, os dois textos (a imagem e a letra da música) trazem uma das metáforas mais belas (pelo menos pra mim): o amor ou qualquer sentimento é como uma planta: requer cuidado, zelo, para ser preservada e dar bons frutos... são contextos diferentes, mas a mensagem é a mesma. quem esqueceu que a plantinha nascida casualmente na bota foi o elo (quase perdido) entre Wall.e e Eva??

Aí vai a letra (simples e perfeita! Paulinho Moska, num show que fez aqui no nosso 4 de Setembro, disse que a coisa mais dificil é fazer uma música simples...)

Pois é
Você chegou aqui
Sorriu, falou
Deu nome ao seu lugar
Pensei e te deixei ficar

Você passou a procurar
Plantou, cresceu
E pôs numa canção de amor
O que colheu

E tudo então que estava ali
Guardado assim no meu lugar
Foi só um nada pra lembrar

Senti meu coração pulsar
Porém tudo ficou no ar
Você parou
Deixou de acreditar
Calou e se perdeu

E tudo então que estava ali
Guardado assim no meu lugar
É só silêncio pra cantar

Nem sei e agora tanto faz
Você se foi
Ficou no seu lugar
Tão só essa canção
(Ricardo Breim / Jean Boechat)

19 janeiro 2010

sobre asnos e flores


às vezes esquecemos de colher as flores no nosso quintal, e espichamos sempre o olhar por cima do muro, e espiamos, com inveja, as flores do quintal vizinho. Às vezes são florezinhas pequeninas, sem perfume, sobre túmulos, mas sempre queremos mais o que não é nosso, o que não está diante dos olhos, se oferecendo...
Por quê?
ultimamente tenho repetido demais essa palavrinha pequena sem me dar conta que existem infinitos motivos para sair por aí colhendo as flores do caminho, inclusive as do meu quintal. Mas eu não quero... Fico sempre a espichar meu olhar para diante e a invejar as flores alheias, a cobiçar aquilo que não é meu...
Quanta burrice num só ser.

Retalhos de cetim



Música de abandono é sempre triste, principalmente para o lado do abandonado. Se eu fosse fazer uma lista, nesse estado de espírito em que estou, não terminaria, pois cairia no choro e aí já viu: dar uma parada p/ tomar água com açúcar, deitar um pouco assistir filmes de comédia pra ver se esqueço e depois voltar tudo outra vez...rsrsrs Mas eu não vou fazer isso comigo, nem com meus 5 fiéis seguidores...
Vou falar sobre uma música da qual gosto muito. Retalhos de cetim é uma composição de Benito di Paula, presente no LP Um novo samba, do ano de 1973.
A canção traz o sentimento de quem é deixado: a descrença nas palavras do outro. Pois, o que mais se pode pensar, se não que o outro mentia quando dizia que amava, que queria ficar junto? E o que pensar do investimento nos sonhos, nos planos? Amor é uma coisa cara: requer esforço e trabalho (como alguém já disse...). Mas o que fazer quando o outro não vê desse modo e, inconsequentemente, passa por cima do esforço e do investimento daquele que mais viveu o amor? Quem disse que amar é fácil???

Aí vai a letra:

Ensaiei meu samba o ano inteiro,
Comprei surdo e tamborim.
Gastei tudo em fantasia,
Era só o que eu queria.
E ela jurou desfilar pra mim.
Minha escola estava tão bonita,
Era tudo o que eu queria ver.
Em retalhos de cetim
Eu dormi o ano inteiro,
E ela jurou desfilar pra mim.
Mas chegou o carnaval,
E ela não desfilou,
Eu chorei na avenida, eu chorei.
Não pensei que mentia a cabrocha,que eu tanto amei.


Aí, eu lembro de outra canção, mas do Chico Buarque, que pode mesmo ser compreendida como o futuro dessa historinha contada pela Benito di Paula. Trata-se de Quem te viu, quem te vê, canção mostrada pela primeira vez no dia 16 de fevereiro de 67, durante o "Pra Ver a Banda Passar", um musical comandado por Chico Buarque e Nara Leão e criado pela TV Record em cima do sucesso de "A Banda". Nessa letra, temos a crueldade do tempo refletida no estremecimento da relação dos dois, que antes eram complementos um do outro. Infelizmente, o sentimento acaba apenas para um... É sempre assim. Enquanto um nutre o que quer que seja em relação ao outro, existe uma força improvável que perece o sentimento, infinito outrora, desse outro que proclama a separação, o afastamento, a distância.

Aí vai a letra do Chico:

Você era a mais bonita das cabrochas dessa ala
Você era a favorita onde eu era mestre-sala
Hoje a gente nem se fala, mas a festa continua
Suas noites são de gala, nosso samba ainda é na rua

Hoje o samba saiu procurando você
Quem te viu, quem te vê
Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
Quem jamais a esquece não pode reconhecer

Quando o samba começava, você era a mais brilhante
E se a gente se cansava, você só seguia adiante
Hoje a gente anda distante do calor do seu gingado
Você só dá chá dançante onde eu não sou convidado

Hoje o samba saiu procurando você
Quem te viu, quem te vê
Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
Quem jamais a esquece não pode reconhecer

O meu samba se marcava na cadência dos seus passos
O meu sono se embalava no carinho dos seus braços
Hoje de teimoso eu passo bem em frente ao seu portão
Pra lembrar que sobra espaço no barraco e no cordão

Hoje o samba saiu procurando você
Quem te viu, quem te vê
Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
Quem jamais a esquece não pode reconhecer

Todo ano eu lhe fazia uma cabrocha de alta classe
De dourado eu lhe vestia pra que o povo admirasse
Eu não sei bem com certeza porque foi que um belo dia
Quem brincava de princesa acostumou na fantasia

Hoje o samba saiu procurando você
Quem te viu, quem te vê
Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
Quem jamais a esquece não pode reconhecer

Hoje eu vou sambar na pista, você vai de galeria
Quero que você assista na mais fina companhia
Se você sentir saudade, por favor não dê na vista
Bate palmas com vontade, faz de conta que é turista

Hoje o samba saiu procurando você
Quem te viu, quem te vê
Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
Quem jamais a esquece não pode reconhecer

17 janeiro 2010

but the fool on the hill...


...sees the sun going down,
and the eyes in his head
see the world spinning around!

Estava ouvindo agorinha The fool on the hill, The Beatles, e lembrei do Le petit prince. Por quê? Por que o tolo na montanha é imensamente feliz sozinho, lá no alto, sem dar respostas a ninguém, sem mostrar seus sentimentos, sem trocar ideias com ninguém... Simplesmente ele vê o sol se pôr e o mundo dar voltas. Ora se a música não resgata aquela metáfora criada por Antoine de Saint-Exupéry dos mundos visitados pelo Pequeno Príncipe em sua trajetória rumo à Terra?!

Em cada mundo há um homem totalmente voltado para a sua própria vida e seus próprios interesses. Vivem sozinhos, "perfeitamente parados", apesar de desempenharem suas atividades com esmero. E não somos nós?? Desde quando damos valor ao que não é feito por nós? Como sermos humanos numa época em que a individualidade impede as pessoas de relacionarem-se? Em que operar máquinas é mais importante do que experiências que exigem reconhecer o outro, pleno de defeitos e imperfeições...

Mas o tolo na montanha ainda percebe o que nós deixaremos de perceber com o tempo: a beleza do sol se pondo e as voltas que o mundo dá.

15 janeiro 2010

solar


o Sol nunca deixa de brilhar.
à noite ele se esconde para brilhar mais longe.
e mesmo assim ainda consegue dar o prazer,
a quem está do outro lado,
de ver estrelas e lua - seus reflexos.

lembro que, um dia, eu consegui ser o pequeno Sol de alguém.
hoje, não passo de pálido reflexo lunar.
mas continuo sendo Sol.
outras galáxias dirão:
pudemos viver sem ele durante tanto tempo?
então brilharei chamas e fogo
no peito de outro alguém.

13 janeiro 2010

natura naturata


quando a natureza
tingir meus cabelos
vou saber do que falam
as árvores no outono.

fio por fio
a natureza me segredará
baixinho, ao ouvido,
o encanto das folhas a cair.

ela falará de ventanias,
tempestades e aridez.
me dirá sobre
o murmúrio tímido
dos rios a secar.

mostrará a mim
o olhar cansado
do tigre caçador.

e eu, aprendiz veterana que serei,
anotarei tudo na face,
onde as marcas
jamais se apagam.

"miséria é miséria em qualquer canto"



Não há nada mais incômodo do que se sentir impotente frente a uma situação de injustiça. É um dos piores sentimentos que posso sentir. Sinto-me uma formiguinha minúscula e sem pernas frente à miséria e à pobreza que me cercam em qualquer lugar que eu vá.
Existem aqueles que fingem não ver as pessoas sentadas nas calçadas, pelo cantos da cidade, a pedir qualquer coisa. Mas qualquer coisa mesmo! Pelas rodoviárias, paradas de ônibus, sinais de trânsito, sempre existe alguém pedindo, implorando uma ajuda. Nos deparamos sempre com a mesma história: "tenho um filho internado e eu preciso inteirar o dinheiro do remédio que acabou ontem." É sempre a mesma história, mas nós nunca saberemos quando é a verdade.
De dentro de seus carrões, seus casarões, as pessoas estendem a mão não para ofertar a ajuda merecida, mas para oferecer esmolas. Este gesto, aparentemente banal, ao contrário do que sua manifestaçao suscita, tira da pessoa que pede a dignidade, o orgulho. Por que não oferecer um emprego? seria uma oportunidade para mudar aquela situação e acabar com a humilhação. Não quero simplesmente repetir o famoso clichê "O trabalho dignifica o homem". Essa é uma verdade, mas não absoluta.
Aqueles que se dizem cidadãos, devem perceber que a melhor forma de ajudar uma pessoa não é dando uma camisa usada (muitas vezes já tão velha, que não passa de um pano de chão), brinquedos usados (muitas vezes quebrados), cestas básicas... Isso são paliativos, servem apenas para maquear a realidade. É preciso haver investimento no futuro para haver mudanças. Enquanto as pessoas acharem que fazem sua parte atirando moedas nas canecas dos mendigos o mundo continuará sendo um grande corredor fétido e escuro onde todas as pessoas seguirão rumo à vala comum.
E, apesar do meu discurso estar repleto de lugares comuns ele é verdadeiro.

12 janeiro 2010

Um lugar na platéia



"O que se quer da vida é um lugar na platéia. Nem muito perto, nem muito longe."

Fala da avó de Jéssica (personagem principal do filme):
"É preciso arriscar, Jéssica. Quer saber? Minha vida foi maravilhosa!"

Filme lindo, trilha sonora linda, história linda e ambientação maravilhosa!
Vale a pena conferir.

11 janeiro 2010

a ineficácia do discurso impessoal em A via láctea


O título é uma brincadeira, na verdade, uma tirada de sarro do academicismo desbragado que anda à solta por aí (contaminando até mesmo a srta. dona deste blog). Mas o conteúdo do post é seríssimo! (será? rsrsrs)

Bom, quem de nós não conhece a famosa canção do Renato Russo, gravada no álbum A Tempestade, no ano de 1994? O famoso refrão repercute ainda hoje em todas as bocas que querem dar consolo: "Quando tudo está perdido sempre existe um caminho, quando tudo está perdido sempre existe uma luz..."
Pois é. Dia desses ouvi uma pessoa cantarolar o bendito refrão. Mas só o refrão. Aí, eu, quase que instantânea e mecanicamente completei a canção: "mas não me diga isso..." Aí, na hora, pensei: caramba! é um diálogo! É claro, está explícito na letra que o eu lírico conversa com alguém, contando o que ele sente, como estão sua mente e seu corpo. Mas a música não é sobre superação, não é a auto-ajuda explícita do refrão. A música expressa simplesmente a lamentável situação em que uma pessoa tenta convencer outra, em seu estado deplorável, de que tudo vai terminar bem, de que as coisas vão mudar (e para melhor!). Vejamos:

"Quando tudo está perdido
sempre existe um caminho,
quando tudo está perdido
sempre existe uma luz.
Mas não me diga isso."

A situação é mais ou menos essa: "Tá bom, eu sei que você vai dizer que tudo vai ficar bem por que você sabe que, na verdade, nada vai melhorar e eu tô cheio de ouvir a mesma coisa de todos que passam por aqui." Dizer que sempre existe um caminho e uma luz é apenas mais uma frase feita para qualquer circunstância. É uma espécie de fórmula para consolar não aquele que sofre, mas apenas aquele que fala! Por que as pessoas sentem-se na obrigação (moral??) de dar esperança a quem está na pior. Então, para desencargo de consciência, diz-se o "vai ficar tudo bem...". A música prossegue:

"Hoje a tristeza não é passageira
hoje fiquei com febre a tarde inteira
e quando chegar a noite
cada estrela parecerá uma lágrima."

Não é a toa que o eu lírico está triste. Ele sabe que as coisas não estão bem. Ele não está bem fisica e mentalmente. E essa tristeza tem um motivo. E forte! Ou será que "cada estrela parecerá uma lágrima" é choro pouco? Imagine!

"Queria ser como os outros
e rir das desgraças da vida
ou fingir estar sempre bem
ver a leveza das coisas com humor.
Mas não me diga isso."

E os conselhos continuam: "Um dia nós riremos disso tudo..." ou "Isso deve ser encarado como uma lição, como um aprendizado..." e ainda "Isso é mais uma provação.", "deus sabe o que faz...", "O Fulano não sei das quantas estava muito pior...", "aconteceu coisa muito pior com o Sicrano"... É claro que e o eu lírico sabe de cor todas essas frasezinhas que não dizem nada a quem ouve e ele responde: "Eu já sei disso tudo, não me fale mais nada sobre isso".

"É só hoje e isso passa
só me deixe aqui quieto
isso passa
amanhã é um outro dia, não é?"

Então ele se apropria do discurso impessoal do seu interlocutor para usá-lo contra ele. Para, de certo modo, concordar com o que o interlocutor diz como forma de se livrar daquela companhia que não entende nem vai entender nada do que ele está sentindo. Por que cada dor dói diferente em cada pessoa. E a dor dele é dele e somente dele.

"Eu nem sei por que me sinto assim
vem de repente um anjo triste perto de mim
e essa febre que não passa
e meu sorriso sem graça
não me dê atenção
mas obrigado por pensar em mim."

Algumas pessoas dirão: "É um egoísmo muito grande, uma pessoa se deixar afundar no sofrimento. Essa pessoa só pensa em si. Não percebe que existem amigos, companheiros que querem o seu bem, que se esforçam para vê-lo feliz!" Cara, mas nos sentimentos ninguém manda. Ninguém controla o que sente. Egoísta é aquele que quer que o outro seja feliz só por causa de sua presença. Por decreto do pretenso amigo, é proibido ficar triste! E perceba que o eu lírico não tem nada de egoísta: ele reconhece a preocupação (na maioria dos casos, ela é legítima!): "Não ligue pro que eu digo. E obrigada por tentar me ajudar, obrigada por pensar em mim."

"Quando tudo está perdido
sempre existe uma luz,
quando tudo está perdido
sempre existe um caminho.
Quando tudo está perdido
eu me sinto tão sozinho,
quando tudo está perdido
não quero mais ser quem eu sou."

O final da canção mostra a pessoalização do discurso do interlocutor: o eu lírico adapta as frases feitas à sua realidade: "Quando tudo está perdido eu me sinto tão sozinho, não quero mais ser quem eu sou..." Ou seja: Sei que as coisas não vão melhorar, pelo menos a curto prazo. Não sei o que fazer, não sei como vou sair dessa, estou só, perdido e seria bem melhor se eu não fosse eu.

"Mas não me diga isso
não me dê atenção
e obrigado por pensar em mim."

Os últimos versos da canção trazem o sentimento do eu lírico diante da situação: "Não leve a sério o que eu digo, pois você pode perder seu tempo tentando me convercer do contrário. Não me diga mais nada e muito obrigado pela preocupação, pela atenção."
A letra é mórbida. Não há como negar. E vai plenamente de encontro às interpretações positivas e de auto ajuda. Na verdade é uma negação a auto ajuda, da maneira como esta é cultivada hoje. Eu diria que a música ensina muito a quem a interpretar de modo mais profundo. Não é uma frase feita, mais um clichê cantado: A via láctea traz consigo o poder de ir ao mais profundo do eu. Ela faz chegar àquele ponto obscuro da própria mente, onde a gente, muitas vezes, se nega a ir, exatamente por conta da escuridão.

06 janeiro 2010

questão de tempo

Antes
Agora
Depois
Não linear é a vida
Palavras
Se perdem
Voam
Não voltam
...
Ontem
Hoje
Amanhã
Questão de tempo.
Livros quadros
Idéias sentimentos
Não se enquadram
Nessa forma
Cronologicamente
Lógica
Engessada
Pesada
Superficial
...
Questão de tempo
...
Gosto de reticências
...
(lembro bem)

O que faz você feliz também faz alguém feliz?

Abrir a janela, comer na panela
viajar pela rua, o mundo da lua
Correr para o abraço, que eu desembaraço,
ou é andar descalço que faz você feliz?
Será que é cuidar da gente,
cuidar do planeta,
fazer diferente, fazer melhor?
Ficar na cama (só mais um pouquinho!)
Comer um bolinho, fazer um carinho,
Se espreguiçar?
É isso que faz você feliz?
Ou é... adivinhar desejo, estalinho de beijo
amar de paixão, arroz com feijão,
uma bela salada, miolo de pão?
Talvez...
a macarronada, brincar de nada,
fazer de tudo, fazer o que você sempre quis...
Me diz: o que faz você feliz
também faz alguém feliz?

texto da propaganda do Grupo Pão de Açúcar.

beleza pura

Beleza nunca fez,
nem nunca vai fazer,
ninguém feliz.

Como seria bom
se tudo o que reverdece
convergisse
à aceitação plena.

Como seria perfeito
se tudo o que se mostra
bem acabado, na oferta,
fosse aceito.

Como seria pleno
se as respostas
viessem lestas, fagueiras,
ao encontro das questões.

Como seria?

04 janeiro 2010

A origem do carpe diem



Não indagues, Leucónoe

Não indagues, Leucónoe, ímpio é saber,
a duração da vida
que os deuses decidiram conceder-nos,
nem consultes os astros babilônios:
melhor é suportar
tudo o que acontecer.
[...]
Enquanto conversamos,
foge o tempo invejoso.
Desfruta o dia de hoje, acreditando
o mínimo possível no amanhã.

Horácio.

considerações sobre a chuva

A madrugada derrama sobre mim o seu silêncio, o seu frio. Ouço os sons da escuridão e penso. A chuva agora cai na cidade adormecida. E eu... Penso. Penso, e dos meus dedos não saem sequer um cigarro aceso, uma luz acesa. O cheiro de terra molhada me distrai por alguns instantes. Como pode alguém se aborrecer com a chuva? Pura ignorância. Não sou a pessoa mais sabida entre nós, mas sei que a chuva faz frutificar. Sei também que a chuva leva árvores, areia, casas, gente. Mas a chuva também traz, principalmente, lembranças. Lembrança de arco iris, de amor.
Lembra dos nossos dias na praia? Lembra do dia que amanheceu chovendo e você estava gripado? Tivemos que esperar, ilhados, as nuvens secar. Eu me lembro: do guarda chuva emprestado, das poças de lama no meio do caminho, daquele vento que espalhou teus papéis, do teu olhar, da tua proteção, do nosso amor. Da praia, mesmo, eu lembro pouco. Nós sequer mergulhamos. Nem no raso... Contemplamos o horizonte, conversamos, até brigamos, mas vimos toda a chuva passar acolhidos nos nossos abraços, confortados por nossas palavras, embalados pela vontade de sair e ver o sol. Mas gostamos da chuva. Ela acariciava nossos rostos, as gotas misturavam-se ao nosso suor. Éramos um na chuva.
A chuva continua em mim, mas eu não sei se esse quadro que eu pintei realmente existiu. Talvez seja mais uma criação da chuva que, agora, cai no meu quintal. Talvez eu tenha sonhado tudo, querido muito tudo isso e, por isso, construi essas lembranças agora, nessa madrugada, no meu quarto.